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mário I. vague VOGUE. 2005
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Ao longe, os sapatos vermelhos pediam o abraço, o carinho fugidio de um olhar ou de uma mão e os olhos esbugalhados confundiam-se no rosto de fim de tarde. Os seios saíam apressadamente do decote, enquanto as mãos os enxotavam com volúpia.
Não sei se era mulher. Sei muito pouco sobre as mulheres.
- Será que me pode arranjar um cigarrinho?
(Será que posso?)
Não se lembrava do nome. Muito pouca coisa havia da qual ela se conseguia lembrar.
Não sei se era mulher. Sei muito pouco sobre as mulheres.
- Será que me pode arranjar um cigarrinho?
(Será que posso?)
Não se lembrava do nome. Muito pouca coisa havia da qual ela se conseguia lembrar.
Por exemplo, da laranjeira. Ela lembrava-se da laranjeira plantada no caminho para a escola. E lembrava-se também do único beijo que a mãe lhe dera, ainda em criança, ainda longe destas ruas e esquinas. Havia também um gato e um homem mau que a roubou e que cobriu a sua pele com a acidez dos homens.
Hoje não era mulher. Eu sei que não.
- Não me arranja lumes? Está cá um frio…
As rugas, excessivamente perdidas na maquilhagem, contavam a história de um cheiro. O cheiro dos homens desarrumado em quartos de pensão. A história do sabor azedo das constantes penetrações. Penetrações que agora lhe atormentavam os sonhos e admoestavam o corpo. E a história era só uma. Uma história mais, entre tantas outras iguais à dela.
- Será que a menina não tem lá por casa um casaquinho? Está tanto frio…
E as mãos gastas pela lixívia tocaram o meu braço que fugiu assustado. O cabelo seco pelos dias passados ao sol começou subitamente a cobrir-me os olhos de pesadelos. E eu tive medo. Medo do vermelho dos sapatos, ou do vermelho dos lábios que ainda perpetuava o beijo dos 15 anos. E o medo não é nada para quem não se lembra do nome. Talvez um fantasma muito baço, talvez um desenho desbotado, esquecido nas memórias de quem não chora.
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As rugas, excessivamente perdidas na maquilhagem, contavam a história de um cheiro. O cheiro dos homens desarrumado em quartos de pensão. A história do sabor azedo das constantes penetrações. Penetrações que agora lhe atormentavam os sonhos e admoestavam o corpo. E a história era só uma. Uma história mais, entre tantas outras iguais à dela.
- Será que a menina não tem lá por casa um casaquinho? Está tanto frio…
E as mãos gastas pela lixívia tocaram o meu braço que fugiu assustado. O cabelo seco pelos dias passados ao sol começou subitamente a cobrir-me os olhos de pesadelos. E eu tive medo. Medo do vermelho dos sapatos, ou do vermelho dos lábios que ainda perpetuava o beijo dos 15 anos. E o medo não é nada para quem não se lembra do nome. Talvez um fantasma muito baço, talvez um desenho desbotado, esquecido nas memórias de quem não chora.
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- Pode fugir menina, mas nos pés levará para sempre o vermelho dos sapatos. O vermelho dos sapatos. O vermelho dos sapatos... São eles que nos escolhem, menina! Os sapatos! Os sapatos. Os sapatos. Os sapatos... São os sapatos que nos escolhem.
E quando, ainda por cima, vermelhos, não há como escapar a essa escolha.
será? ...
talvez ("São os sapatos que nos escolhem")
...
:)
eu costumo dizer que são os livros...são os livros que nos escolhem...
nunca tinha pensado que também os sapatos poderiam...
Eu escolho e gosto sempre de te ler!!!
Beijo, Agripina!!!