Franziskus Wendels.Chez les Schmitz. 2003
Acho que as borboletas estão a desaparecer. Dizem que são cegas, mas eu tenho medo. Abro a janela. Tenho cuidado, não vão elas atacar-me…
Lá ao fundo, passam duas senhoras. Têm a mesma bata, o mesmo tamanho, o mesmo corpo “mal ajeitado”. Uma fuma, a outra fala enquanto gesticula apressada uma história sobre bruxas. Tenho a certeza que é sobre bruxas, não consigo ouvir, mas tenho a certeza. Dizem que sou surda. Não sei, mas tenho medo.
O telefone toca. Por momentos, sim, por momentos, ocorreu-me que pudesses ser tu, mas não, não eras. E lá diz a lengalenga, longe vão os tempos… Os tempos em que os nossos corpos se encontravam às escondidas, os tempos em que os nossos suores se confundiam, os tempos em que era amor o que fazíamos. E lá diz a lengalenga, longe vão os tempos…
Passa um carro. Dois carros. Três carros. Um rapaz atravessa a rua calmamente, a rua a coxear. Sim, está a coxear. Não sei bem porquê, mas hoje toda a gente coxeia. Hoje toda a gente tem calor. Hoje toda a gente tem medo de borboletas. Hoje é terça-feira e eu não jogo às escondidas. Deixo-me antes jogar. E ups, empurro-me contra a parede, e ups, parto o vidro, e ups, caio. Hoje é terça-feira e eu não jogo às escondidas, deixo-me antes jogar.
Sabes, às vezes consigo ter saudades, saudades do calor, saudades das borboletas e até porque não, saudades das centopeias. Era um banho, com vista para o Douro se faz favor! E uma gaivota vadia, nos telhados da cidade velha, pode ser?! Sabes, às vezes até tenho saudades de ser velha e outras deixo-me rir à descarada, abro a janela do meu quarto e fico à espera, à espera, à espera…
Sabes, às vezes queria ser feia. Deixar-me ter asas e voar, como elas. Ali. Não vês?! Estão a rodopiar junto ao candeeiro. Ora olha! Vês, estão ali. E ser cega, surda, muda. E ser bicho. E poder ser a borboleta que te adormece o sono. Não fujas, duro um dia! Não fujas… E três rapazes, ainda novos, acotovelam-se uns aos outros. E do outro lado da rua atravessam mais dois. E passa um carro e mais um e mais outro. Hoje é terça-feira.
Nunca te disse mas as minhas asas também são de papel.... por isso voamos sempre à mesma altura, com o mesmo medo e com a mesma suavidade...
Até agora.
bjinhos
"Não fujas, duro um dia!"
A brevidade do mundo...
Tenta pensar assim às terças-feiras...
Bj
ainda bem que só duram um dia! de longe são belas, mas de perto elas são o que são: insectos e têm nelas o horror do que não controlo. sinto ao vê-las arrepio
estou tão deslumbrada com este blog, que gostava que fosse meu