
17:00 - Hoje reguei as plantas

16:44 - Tenho exactamente seis anos
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i never need to worry again. Brian Royalty.
Descobri que hoje ainda não me vi ao espelho. Descobri que hoje tenho um pouco mais de barriga, um pouco menos de força. Descobri que a minha corcunda aumentou e que a elasticidade dos meus músculos se cansou. Hoje tenho exactamente 56 anos e não sei o que fazer com eles. Tenho exactamente seis anos.
19:13 - E ser uma linha

Procuro-te ainda. Ainda nesta cama, ainda neste quarto de segredos, ainda nesta casa de cactos malvados.
E das janelas consigo ver-te ao longe, ainda com as margaridas. E ouço-te os passos e saboreio-te as mãos e percorro-te o corpo doce de tangerina azul. E sei-te sol, e sei-te corpo esguio por onde o meu se perde e contra perde.
E os lençóis conhecem-te o sal, e as paredes transpiram-te o cheiro, sabor de orquídea selvagem, de aloendro sempre em queda. E ir. Perder-me no calor moreno desse vulto sempre ausente, desse fundo tão sem fundo. E ser uma linha. Contorcer-me, dobrar-me e redobrar-me. Ser uma linha e desaparecer-me.
E ao longe um barco. E da tua voz rouxinóis. Da tua voz sempre rouxinóis.
13:37 - Ela era as asas que dela brotavam
Com a ânsia própria de quem saía da clausura, ela abraçava o infinito majestosamente. Abraçava-o em forma de sol que tão bem perpassava a janela que a sustinha, que tão bem lhe abrilhantava as ruborizadas maçãs do rosto e lhe adocicava os gestos tornando-os mel. Os seus libidos olhos de pérolas de damasco eram acariciados e cacau quente tomava-lhe o peito de meia-lua, lua inteira. A inquietude das águas, inclinava-lhe bem ao de leve a cabeça, como pólen tonto que lhe quebrava o jeito; e da sua boca, ameixa seca de vermelho pintada, saíam nus os pés, desnudados os passos. Ouviam-se amoras soltas e bebia-se nela todas as cores todos os matizes. Tocava-se com cuidado o aroma de café embebido em sonho e murmurava-se ininterruptamente o húmido calor das coisas. O trémulo ímpeto do beijo era escondido por entre dedos de sôfrego cabelo e as suas profusas mãos acolhidas pelo deambulante, sibilante vão das pernas. O corpo era assim papoila transfigurada, flor de ópio tornada vida. Era o roxo emancipado, segredo nefelibata. Ela era as asas que dela brotavam. Poema feito braços.
01:07 - Fazer a lua
11:46 - O tempo é um moínho
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